A Tobis, produtora de filmes emblemáticos do cinema português, como o pioneiro "Canção de Lisboa", celebra 75 anos em 2007 e assinala a data com um estudo do Instituto de História Contemporânea que promete reavivar muitas memórias.
Uma equipa de investigadores coordenada pelos professores António Reis e Maria Fernanda Rollo, do Instituto de História Contemporânea, (Universidade Nova de Lisboa), está a trabalhar numa abordagem multidisciplinar da Tobis.
O estudo vai focar o contexto político, social e económico em que foi criada e se desenvolveu a Tobis, a par da indústria cinematográfica em Portugal.
"É o que a Tobis representa ao longo de todos estes anos", resume Afonso Rato, administrador da empresa que nasceu da iniciativa de portugueses, mas com tecnologia alemã.
Segundo Fernanda Rollo, trata-se de uma história de grande abrangência e que "escapa um bocadinho àquilo que tem sido produzido e muitas vezes se centra na Tobis como produtora de cinema português no que respeita às suas ligações políticas e às questões da propaganda".
"A nossa preocupação é tentar fazer a história da Tobis no contexto geral da indústria cinematográfica em Portugal e da produção, compreendendo os desafios técnicos que lhe estão associados, a implantação de uma indústria que foi extremamente pioneira no contexto nacional e no fundo a cultura de massas de que necessita", acrescenta.
No final dos loucos anos 20 começavam já a despontar na pacata sociedade portuguesa tertúlias e debates sobre o futuro do cinema e a criação de uma indústria cinematográfica em Portugal.
Em Agosto de 1930, o Inspector de Espectáculos convocava profissionais do cinema e jornalistas para formar uma comissão encarregue de estudar as condições da criação de uma indústria cinematográfica no país governado por Salazar.
Ricardo Jorge e Raul Lino, representantes do São Luís e da empresa do Tivoli (do sector de exibição), João Botto de Carvalho, sócio-gerente da Sociedade Geral de Filmes e J. Castello Lopes (que representavam os distribuidores), José Leitão de Barros, director da produção da Sociedade de Superfilmes e Aníbal Contreiras, sócio do laboratório Lisboa Filme (dos produtores) integravam a comissão, juntamente com os jornalistas Eduardo Chianca de Garcia e António Lopes Ribeiro (pela imprensa especializada).
Entretanto, a estreia de "Sombras Brancas nos Mares dos Sul", de W.S. Van Dyke, no Cinema Royal, marcava a exibição do primeiro "talkie" (filme falado) em Portugal.
Em 1931, estreava no São Luiz "A Severa", de Leitão de Barros, e nesse mesmo ano a comissão apresentava um relatório em que sugeria a construção de um estúdio para a realização de filmes portugueses com artistas portugueses.
Em 1932, concluíam-se as negociações com a Tobis Klangfilm e era constituída a Companhia Portuguesa de Filmes Sonoros Tobis Klangfilm, com um capital inicial de mil contos.
Poucos meses passados, eram publicados no Notícias Ilustrado os ante-projectos da primeira série de construções da Tobis, da autoria do arquitecto Cotinelli Telmo e do técnico francês A. Richard, para se iniciar pouco depois a construção do estúdio.
Em 1933, a Tobis Portuguesa celebrava um contrato com as congéneres alemã e holandesa para o aluguer de uma aparelhagem para a tomada de som.
O trabalho dos técnicos, o voluntarismo, o improviso, a formação de profissionais, para os quais a Tobis foi também uma "grande escola de aprendizagem", a legislação que foi preciso criar para regulamentar a actividade e os recintos de espectáculo são também focados no estudo, afirma a professora Fernanda Rollo.
O resultado do trabalho, feito por especialistas em História e Comunicação Social, com recurso a várias fontes (públicas e particulares) será materializado num volume e na produção de conteúdos "bastante ambiciosos" para incorporar um portal da Tobis, afirma.
Está também a ser equacionada a realização de um vídeo de apoio a todo este material.
Os investigadores deparam-se, porém, com algumas dificuldades na recuperação de todas estas memórias e apelam à colaboração dos cidadãos que possam contribuir com espólios particulares - fotos, cartazes, revistas, jornais, autocolantes, folhetos ou outros documentos - que serão devidamente preservados e devolvidos.
"Infelizmente, as nossas instituições preocupam-se pouco com a preservação do seu património documental e hoje em dia uma das nossas dificuldades tem precisamente a ver com conseguirmos recuperar a informação relativamente a tudo isto", indica.
Filha do Estado Novo, adoptada pela Democracia, a Tobis sofreu ao longo das últimas décadas profundas transformações ao nível dos estatutos, instalações, conteúdos e técnicas de produção.
Fernanda Rollo destaca que a Tobis é hoje uma empresa extremamente competitiva em termos de equipamentos, com um sofisticado laboratório, e óptimos resultados financeiros.
No ano passado, a empresa de pós-produção de televisão e cinema apresentou lucros de 404,6 mil euros, um crescimento de 496 por cento face a 2004.