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Tabuleiros de Tomar com origens anteriores ao século XIV

por Nuno Patrício - RTP
Paulo Cunha, Lusa

A história da Festa dos Tabuleiros confunde-se com o tempo e com as crenças do povo e voltam a desfilar na cidade Templária de Tomar.

Os atuais festejos, que fazem de Tomar a sua cidade berço, remontam às arcaicas 'festas do imperador', e foram instituídos pelo Rei D. Dinis e pela Rainha Santa Isabel, no quadro do culto do Espírito Santo.

Mas as suas origens serão pagãs. Segundo alguns investigadores, a sua origem encontra-se nas festas de colheitas à deusa Ceres. Uma prática ancestral de entrega das primícias das colheitas à deusa Ceres e de celebração da fertilidade da terra.

Nos dias de hoje, centenas de pessoas continuam a recriar esses tempos, mantendo viva uma tradição que o tempo não esqueceu e que as gentes nabantinas querem perdurar.
Origens pagãs e cristãs
Quando se fala desta festa obrigatoriamente tem de se falar do povo e da sua solidariedade para com os outros.

Esta tradição é uma das manifestações culturais e religiosas mais antigas de Portugal.

A conversão desta festa para o cristianismo presume-se ter sido feita pela Rainha Santa Isabel, durante o século XIV, que lançou as bases do que seria a Congregação do Espírito Santo. Um movimento de solidariedade cristã que, em muitos lugares do reino, absorveu as primitivas festas pagãs.

O ponto alto destas festividades juntava ricos e pobres sem qualquer distinção e ocorria no “domingo de Pentecostes”, dia em que as línguas de fogo desceram sobre os Apóstolos.

Os "Tabuleiros" seriam as dádivas dos mais ricos, com oferendas de pão e cereais, para posterior repasto dos mais pobres, num gesto de partilha fraterna e símbolo da distribuição dos dons do Espírito Santo e da abundância de Deus.

    
Foto: Festatabuleiros.org

No século XIX encontram-se referências às festas do Espírito Santo e até 1895 fazia-se o cortejo anual à Sexta-feira, por alturas do dia 20 de Junho, com a tradição do sacrifício dos bois, cuja carne seria depois distribuída por todos. Já a partir de 1966, os bois do Espírito Santo voltaram ao cortejo, mas agora só com funções simbólicas, perdurando até os dias de hoje.
 
  
Foto: Festatabuleiros.org

Nos dias correntes os símbolos do Espírito Santo continuam bem presentes nos 'Tabuleiros' que as raparigas transportam no cortejo: no cimo é colocada a Pomba do Espírito Santo ou a Cruz de Cristo.

Cada 'Tabuleiro' tem também caracteristicas específicas. Deve ter a altura da rapariga que o leva à cabeça e ser constituído por trinta pães (aos quais se atribuíam virtudes milagrosas) enfiados em cinco ou seis canas que partem de um cesto de vime ou de verga. O conjunto é enfeitado de flores de papel (tradicionalmente, papoilas) e de espigas, sinal de fertilidade.
Festa dos Tabuleiros ou Festa do Divino Espírito Santo
Esta Festa de "Acção de Graças" e de oferendas manteve as suas características inalteráveis até ao século XVII.

A tradição continua e muitas das suas cerimónias, como o Cortejo da chegada dos Bois do Espírito Santo, que tem o nome de Cortejo do Mordomo, o Cortejo dos Tabuleiros, a sua bênção, a forma do tabuleiro, os vestidos das raparigas portadoras dos Tabuleiros e a Pêza ou distribuição do pão e da carne, mantêm-se (desde há alguns anos a esta parte também se distribui o vinho).

Algumas das alterações que foram surgindo depois justificam-se no sentido de conferir uma maior grandiosidade a esta Festa.

A principal característica da Festa dos Tabuleiros é o Desfile ou Procissão, com um número variável de 'Tabuleiros', em que estão representadas as atuais dez freguesias do concelho.

Esta procissão de dignidade, cor, brilho e emoção percorre as principais ruas da cidade, num percurso de cerca de 5 quilómetros, por entre colchas pendentes nas janelas, milhares de visitantes nas ruas e uma chuva de pétalas que, de forma entusiástica, é lançada sobre o Cortejo.



Veja aqui o percurso da procissão

Cortejo das Coroas
O Cortejo das Coroas é o primeiro acto solene da Festa dos Tabuleiros e destinava-se, antigamente, a anunciar à população a próxima celebração da sua Festa maior ('Festa dos Tabuleiros').

Sendo Festa religiosa, esta celebração consiste em sete saídas das Coroas. Sete, porque é o número perfeito a nível da Igreja Católica (e de várias outras religiões e teorias de numerologia).

A primeira saída é no Domingo de Páscoa, a segunda no Domingo de Pascoela e as restantes de quinze em quinze dias, até ao dia 24 de Junho, último Cortejo de Coroas antes da Festa dos Tabuleiros.

Estas festividades contemplam já as ruas decoradas com colchas coloridas nas janelas e o chão com verdura, ao qual o povo vai lançando flores à passagem do Cortejo.
Cortejo dos Rapazes
Desde o início das suas actividades no séc.XX, os Jardins de Infância e Escolas de 1º ciclo do concelho de Tomar tiveram como filosofia trabalhar junto da comunidade local dando a conhecer a cultura e tradições.


Foto: Paulo Cunha - Lusa

Desta ideia inicial e com o aproximar da Festa dos Tabuleiros de 1991 surgiu a ideia de integrar os mais novos no espirito festivo e fazer reviver o "Cortejo dos Rapazes" que se tinha realizado a última vez por finais dos século XIX.

O "Cortejo dos Rapazes" é uma representação fiel dos 'Tabuleiros' dos adultos.



Este ano estiveram envolvidas nas festividades cerca de 1.700 crianças que desfilaram pelas ruas de Tomar, numa "antecipação em miniatura" do 'Cortejo dos Tabuleiros', ponto alto de uma festa que se realiza de quatro em quatro anos na cidade de Tomar.
Cortejo do Mordomo
Não se sabe com rigor a origem do "Cortejo do Mordomo", mas estima-se que, de início, seria um hino à abundância simbolizada nos bois que iriam ser abatidos para o Bodo.

"Os Bois do Espírito Santo" como eram chamados, desfilavam perante o olhar da população sendo posteriormente abatidos e a carne distribuída a toda a população, ricos e pobres, em celebração de um mundo novo e fraterno.

Desde 1966 que os bois já não são abatidos, estando no entanto presentes no cortejo.

Os bois são enfeitados com colares e brincos de flores, desfilando pelas ruas da cidade ao som de foguetes, gaiteiros e banda de música e acompanhados de vários cavaleiros assim como algumas charretes que transportam os Mordomos e convidados.

A tradição da entrega da carne, que outrora provinha da matança dos animais, continua a existir mas agora a carne é obtida junto dos proprietários dos talhos e entregue apenas e unicamente a famílias carenciadas.
Ruas Populares Ornamentadas
A "Festa dos Tabuleiros" é, hoje, essencialmente uma festa de cor e movimento.

Uma das formas mais características da população mostrar a alegria pela realização da Festa é a ornamentação das suas ruas, chamadas de populares porque a maioria se encontra no chamado centro histórico da cidade onde o bairrismo ainda subsiste.

O talento e o trabalho dos "decoradores" é premiado e avaliado pela Comissão das festas, que oferece placas a premiar a Cor, a Harmonia ou a Tradição, sendo contempladas todas as ruas concorrentes.
Cortejos Parciais e Jogos Populares
A necessidade de reunir os Tabuleiros das diferentes freguesias para o "Cortejo de Tabuleiros" levou, a partir dos anos 50, à introdução de um elemento novo – um desfile em separado dos tabuleiros das diversas freguesias que, partindo de um local previamente escolhido, passam junto ao edifício dos Paços do Concelho onde são recebidos pelo Mordomo, Presidente da Câmara e Vereação, dirigindo-se para a Mata Nacional dos Sete Montes, onde ficam em exposição até ao Cortejo de domingo.

Claro está que não existe uma boa festa sem um bom jogo popular. A Festa dos Tabuleiros era o grande acontecimento que atraía a Tomar a população das redondezas que se deslocava, como era habitual na época, a pé, de carroça ou sobre os muares.

E os jogos como a corrida de burros era a parte mais animada e interessante da festa. Em 1964, houve uma readaptação e os Jogos Populares adaptaram-se.

Os jogos passaram a ser inspirados no trabalho como o corte de troncos a machado e corte de troncos a serrote. Mais tarde introduziu-se o chinquilho, a gincana de burros, a corrida de carroças, a corrida de cântaros, a subida do mastro, a corrida de sacos, a corrida de pipas e a corrida de púcaros.
Cortejo dos Tabuleiros
É a grande atracção e o motivo principal da Festa: os Tabuleiros.

Uma importância tão grande que deu o nome à Festa que hoje só é conhecida por Festa dos Tabuleiros.

O “Tabuleiro” uma peça de arte popular com uma altura variável (altura da portadora), é uma oferta de pão, por isso o pão deve ficar à vista, a ornamentação pertence ao gosto de quem o decora, com flores de papel e verdura se for caso disso.

    
Foto: Festatabuleiros.org

O desfile é composto por várias centenas de representantes, masculinos e femininos, das freguesias de Tomar. Segue um percurso predelineado ao longo da cidade templária, com cerca de cinco quilómetros.

O “par” vai trajado a rigor. A rapariga leva vestido comprido, branco, com uma fita colorida a cruzar o peito; já o rapaz traja com uma simples camisa branca de mangas arregaçadas, calças escuras, barrete preto ao ombro e gravata na cor da fita da rapariga.

Ela leva o “Tabuleiro” e ele vai ao lado, a acompanhar. Só em caso de 'aflição' da companheira é que ele têm de levar o comprido e ornamentado 'tabuleiro'.

Um desfile que o historiador, Manuel Guimarães relata desta forma: «As raparigas, figuras principais, desfilam em duas longas filas ao lado dos seus ajudantes (os rapazes) que seguem do lado de dentro mas sempre atentos às companheiras. Dirigem-se à Praça da República onde o Cortejo enrola harmoniosamente até preencher sem sobressaltos a placa central. Um representante da Igreja vem à Praça, paramentado, dar a bênção aos Tabuleiros. Depois, a um sinal do sino, é a elevação, um momento inesquecível. Uma moldura humana impressionante, aplaude comovida este momento mágico, único, pela sua grandiosidade, simbolismo e beleza, único na nossa arte e na nossa cultura.»
Bodo ou Pêza
Os 'Bodos do Espírito Santo', (refeição sagrada) e a Pêza, instituídos pela Rainha Santa Isabel são o último acto de cada Festa dos Tabuleiros.

Acontecem no dia a seguir ao Cortejo dos Tabuleiros (segunda-feira) e, de acordo com a tradição (porque os Dons de Deus - frutos da terra e dos rebanhos - carne, pão e vinho - são para todos), numa forma de agradecimento a Deus, constam da partilha do pão, da carne e do vinho. Agora só para os mais necessitados.
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