Shakespeariana "Comédia de Desenganos" de Luísa Costa Gomes estreia-se hoje no Teatro do Bairro
Lisboa, 21 set (Lusa) -- Luísa Costa Gomes escreveu uma comédia sobre o amor, que é uma "realidade alternativa" à da peça de Shakespeare "Sonho de Uma Noite de Verão", António Pires encenou-a e a estreia é hoje no Teatro do Bairro, em Lisboa.
Chama-se "Comédia de Desenganos" e não é, como disse Luísa Costa Gomes à Lusa, "propriamente uma `sequela`" de "Sonho de Uma Noite de Verão", mas "uma `realidade alternativa` que vai buscar ao Sonho algumas personagens".
Nesta peça, são-nos apresentados os mesmos reis -- o rei Oberon (rei consorte dos Elfos) e a rainha Titânia (rainha das fadas) -- e as mesmas criaturas encantadas -- ninfas e faunos -- que, tal como em "Sonho de Uma Noite de Verão", são transportados para o caminho da ilusão e do engano, juntando-se-lhes novas figuras e novas tramas amorosas, numa reflexão mais profunda sobre as consequências dos amores desenganados.
Oberon (João Barbosa) e Titânia (Alexandra Rosa) vivem agora num reino árido e deserto, com uma reduzida corte de faunos e ninfas, e Titânia tenta várias vezes matar o marido, que é sempre salvo com poções mágicas e tisanas pelas duas ninfas, Leia (Sandra Santos) e Filomela (Rita Brütt), e pelos respetivos namorados, os faunos Melcatec (Graciano Dias) e Jacinto (Francisco Tavares), sem que a rainha suspeite.
A dada altura, com "filtros mágicos potentíssimos" à mistura, aqueles que se amavam passam a amar outros, havendo mesmo um momento em que tudo isso é explicado ao microfone, com uma música do género algazarra mix em fundo, pela narradora, num encadeado que faz lembrar o poema "Quadrilha", de Carlos Drummond de Andrade, musicado por Chico Buarque.
Até Altina (João Araújo), a escrava da rainha, e o pastor Simplório (João Cabral) são vítimas desta teia de amores enfeitiçados.
O encenador indicou que concebeu esta peça "quase como se fosse uma coreografia", o que foi possível porque "é um texto muito poético", que o fez lembrar Lorca, Shakespeare e Gil Vicente.
Sobre a razão que a levou a regressar ao universo shakespeariano para ir buscar algumas das suas personagens, Luísa Costa Gomes comentou que "são coisas que não se decidem. Shakespeare está lá sempre no caminho, faz parte do programa. É a referência".
A escritora explicou, de seguida, que "a comédia de enganos é um tipo de comédia muito baseada no enredo, que vive da coincidência imponderável, do volte-face que se torna em volte-volte-face, do permanente intrigar e do jogo do mascarar/desmascarar. Na comédia de enganos tudo acaba normalmente bem, todos celebram bodas e dizem mal dos atores. Nas comédias de desenganos, as personagens sabem que lá porque o pano cai, não quer dizer que a comédia tenha acabado".
Segundo a escritora, "a peça tem uma atmosfera muito infantil, de conto infantil", que António Pires "explorou bem, não carregando, por um lado, nos aspetos histriónicos da representação, e enfatizando na coreografia o valor simbólico primário de cada uma das personagens".
Esta "Comédia de Desenganos" estará em cena no Teatro do Bairro até 22 de outubro, de quarta-feira a sábado, sempre às 21:00.