"Como um pedaço de terra virgem" é o título do livro-CD que reúne quase toda a poesia popular escrita e dita por Virgínia Dias, camponesa alentejana que publica a primeira antologia aos 84 anos, revelou a editora Boca.
"Obra de uma vida", o livro-CD "testemunha o modo especial como a autora encadeia poemas, canções e as estórias que lhes estão na origem", refere a editora.
Virgínia Dias nasceu em 1935, em Peroguarda, Ferreira do Alentejo, começou a fazer poesia ainda antes de saber escrever, fez apenas o ensino primário, para trabalhar no campo, mas foi acumulando poemas ao longo da vida, marcados pelo Alentejo, inspirados pela poesia popular e pela temática da injustiça.
Privou com o realizador António Reis, com o etnólogo Michel Giacometti (que está sepultado em Peroguarda), com o músico José Mário Branco e com o cineasta Pierre-Marie Goulet, que a filmou na trilogia "Polifonias" (1997), "Encontros" (2006) e "Além das Pontes" (2016).
Apesar de ter publicado ocasionalmente em concursos literários, "nos quais arrebatou prémios e menções honrosas", o trabalho poético da autora só agora é reunido nesta antologia, que conta com prefácio de José Mário Branco, escrito em maio de 2018, e fotografias de António Cunha e Luís Ferreira Alves.
Ficam reunidos cerca de uma centena de poemas, a maioria dos quais gravados em casa de Virgínia Dias, com um trabalho de sonoplastia que inclui sons do campo.
No prefácio, José Mário Branco recordou "as viagens de formação" que fez a Peroguarda nas férias da Páscoa, e nas quais "quase não falava".
"Nesses dias eu ouvia, ouvia, ouvia - as conversas, os cantos, a poesia natural, rústica e dura daquelas vidas. (...) Ouvi o passo arrastado e pendular dos homens cantando de regresso a casa, ao fim da tarde - passos que depois iriam aparecer na `Grândola Vila Morena` do Zeca Afonso", recordou.
Foi numa dessas viagens que José Mario Branco conheceu Virgínia Dias.
"Não precisaria de ler os versos da Virgínia para vos dizer o que digo, porque tudo aquilo - as férias em Peroguarda - era poesia total, que me alimentou para toda a vida. Ao ler estes poemas da Virgínia, encontrei neles a alma e o corpo de Peroguarda, de todo o Baixo Alentejo e de todo o universo que dali vislumbrei", escreveu José Mário Branco.
"Como um pedaço de terra virgem" será apresentado a 08 de dezembro na Casa do Povo de Peroguarda, com a participação de Adelino Gomes, Cristina Taquelim, Paulo Lima, Marta Ramos, Ana Cristina Pais, António Cunha, Pierre-Marie Goulet, Teresa Garcia e Luís Ferreira Alves.
Serão projetadas imagens dos filmes de Pierre-Marie Goulet, e está prevista uma atuação do grupo de cantares Alma Alentejana.
"Como um pedaço de terra virgem" é uma edição do projeto editorial Boca, dedicado ao audiolivro para vários públicos, reunindo teatro radiofónico, contos, canções e outras histórias da tradição oral, portuguesas e estrangeiras.