Mulheres que Contam. Dorina Lindemann

por Silvia Alves - RTP

Dorina Lindemann - enóloga, viniviticultora na Quinta da Plansel. "Eu acho que já nasci com vinho no sangue."

Dorina Lindemann nasceu na Alemanha, numa zona de vinhos, em Neustadt Weinstrasse.

Na realidade, a sua ligação a Portugal começa por um acaso, por uma espécie de naufrágio do pai, em 1961. Hans Jörg Böhm , velejando a caminho das Seicheles, teve de fazer uma paragem forçada em Cascais. Numa altura em que ainda não existia barra, o veleiro ficou em mar aberto. Durante a noite, foi abalroado por um barco de pesca. E foi assim que Hans Jörg Böhm ficou a conhecer Portugal.

Hans Jörg Böhm pertencia a uma família que era dona de uma das maiores empresas de importação e produção de vinho da Alemanha, um negócio que existia desde os tempos de Napoleão.

Mas foi Portugal que o conquistou e apaixonou-se pelos nossos vinhos. Já nos anos 70, comprou uma quinta em Montemor-o-Novo e propôs-se investigar e melhorar a qualidade das castas nacionais. Publicou a obra de referência O Grande Livro das Castas.
Ao contrário do pai, que nunca produziu uma única gota de vinho, Dorina Lindemann cumpriu o seu sonho. Estudou Enologia na Hochschule Geisenheim University, ao lado de outra mulher, e rodeada por 99 estudantes masculinos. Sendo mulher, arranjar trabalho na viticultura era tarefa quase impossível.

No fim do curso, em 1993, resolve dar um salto aventureiro com o marido. Destino: Portugal. Foi a melhor coisa que fez na vida, diz.

Chegou a um Alentejo ainda fortemente atrasado, em que o papel das mulheres era secundário.
 
Os viveiros Plansel (planta e selecção) já eram conhecidos. Em 1997 arrisca o sonho com a Quinta da Plansel e começa a fazer vinho.

Dorina Lindemann teve de despedir todos os homens – ninguém aceitava as suas indicações e ordens - e começou a adega com 2 mulheres, a Florinda e a Florbela, que ainda hoje a acompanham.
Bateu-se para que as mulheres começassem a sair, entenda-se, a ir beber um café ou ir a um restaurante. Chegavam telefonemas para o marido ou o pai a “fazer queixinhas”.

"Nós temos de lutar, nós mulheres temos de trabalhar em conjunto. E há muita mulher que ajudou a minha vida aqui no Alentejo". Em quase trinta anos, muita coisa mudou.

Começou por fazer um champagne alentejano. Mas era vinho que queria fazer, com uma casta que sempre considerou fora do normal, a touriga nacional, e que no terroir de Montemor-o-Novo revela todo o seu potencial. Dorina chama-lhe o seu vinho "bissexual", porque tem "personalidade, notas de floral em frente, flor de laranja, é muito expressivo aromaticamente, mas, por outro lado, também muito masculino, muitos taninos, muita estrutura".
Dorina divulga os vinhos portugueses com paixão. Na Ásia, na América, na Alemanha e noutros países europeus.

"Eu vejo que Portugal tem tanto potencial para ser muito conhecido no mundo, nós temos mais de 300 castas nativas, 150 castas nossas são únicas, daí têm personalidades tão fantásticas que deviam ser cada vez mais trabalhadas."

Numa altura em que se prevê a redução da utilização de fungicidas, e no cenário das alterações climáticas que comporta temperaturas mais elevadas, a Quinta da Plansel tenta aliar resistência a qualidade. Produzir menos com mais qualidade, a um preço mais elevado pode ser a solução do futuro para a sobrevivência dos produtores.


Hoje em dia, Dorina Lindemann participa em provas vinícolas internacionais. E dá aulas sobre as castas portuguesas, clima e regiões do país na Universidade de Geisenheim onde se formou.
A Quinta da Plansel desdobra-se em tantos aspectos quantos cabem na sua enorme paixão por Montemor, pelas pessoas, os seus colaboradores, a família. As duas filhas garantem a continuação do seu sonho concretizado.

Quinta da Plansel oferece enoturismo, cursos na International Wine School Plansel (WSET).

Dorina Lindemann é uma mulher com energia, durante anos dançou na escola de dança de Rui Horta e Pia Grämer, o Espaço do Tempo. Não consegue estar parada, por isso, os tempos livres são passados na vinha, ou a passear, a dançar.

Na leitura, aprecia biografias, mas também thrillers, e ler sobre arte. Cresceu rodeada de arte. E gosta de música erudita – gosta especialmente de Verdi porque toca no coração.

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