Carmen Garcia apresenta-se como "mãe, mulher, enfermeira e quase sempre cansada."
A família paterna já veio fugida de Espanha, dos anos da guerra civil no regime de Franco - fugiram de uma guerra e, depois, viram o neto mais novo, o pai de Carmen, ser enviado para outra, que nem era a guerra dele, e que ele nunca compreendeu.
30 meses de Moçambique deixaram-no marcado, com tremores. Carmen diz “eu sempre soube desde pequenina que era um tremor que vinha da guerra, que vinha de Moçambique”.
“Porque a maternidade é difícil. E as mães precisam de rir”, criou o blog a mãe imperfeita, onde trata as coisas pelo nome, sem falsos pudores. Assumiu-se como mãe imperfeita no dia em que, tendo visto no Instagram um vídeo de um casal à mesa com 4 filhos pequenos, todos vestidos de igual, a comerem com uma correcção inacreditável, apanhou o seu filho a comer um macaco do nariz. E concluiu que “isto é uma metáfora da minha vida”. O blog conta, entretanto, com quase 200 mil seguidores.
Sendo alentejana de gema, sabe bem que o país está dividido entre litoral e interior. Na sua atual vida profissional, dedica-se ao projecto ALICE, que utiliza a inteligência artificial para monitorizar idosos que vivem em lares, ou sozinhos. A sede tecnológica da empresa é em Évora.
“Há um estudo feito aqui na nossa região, que nos dá alguns indicadores interessantes. Por exemplo, nós sabemos que a média de idades das pessoas que residem no lar aqui é de 86,6 anos, portanto, muito mais alta do que era há 10 ou 15 anos. Sabemos que só 7.3% das pessoas é que chega às instituições sem ter pelo menos um défice, e que quase 40% já chega com uma doença instalada. Portanto, a demência é um desafio - o ALICE tem crescido nesse sentido, e depois temos procurado muito ir ao encontro das necessidades de cada pessoa em particular, ou seja, uma pessoa que viva completamente sozinha, que não possa ter um cuidador, nós temos que ter uma forma de responder às suas necessidades também. Então, em vez de utilizarmos se calhar, por exemplo, um oxímetro que ela ponha quando não se está a sentir tão bem, para ver o que é que se passa, utilizamos outro tipo de sensor, que está na roupa, que nos dá uma monitorização contínua, nós sabemos sempre o que é que está a acontecer. O que é que nós conseguimos fazer com isto? Conseguimos evitar idas ao hospital, porque resolvemos muita coisa no local. Conseguimos atuar precocemente porque como nós sabemos qual é o padrão daquela pessoa, a inteligência artificial vai recebendo os dados traçando um padrão. Quando há um desvio, nós conseguimos dizer: atenção a este valor, é melhor ver o que é que se passa aqui. Isso é uma coisa com imenso potencial.”
Na aplicação desenhada especificamente para a plataforma ALICE, existe uma área de educação para a saúde destinado a três grupos de utilizadores: utentes, cuidadores e profissionais de saúde. Cada um dos grupos tem acesso a um conjunto de conteúdos específicos, em multimédia, criados de raiz.
O ALICE destina-se especialmente a cidadãos com mais de 65 anos, no entanto, todos os maiores de 18 anos que apresentem algum grau de dependência funcional podem beneficiar do ALICE. A plataforma está orientada para actuar em três cenários distintos: 1. Apoio à prestação de cuidados de saúde em Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI); 2. Apoio à monitorização e prestação de cuidados a adultos que residam no seu domicílio em situação de vulnerabilidade; 3. Apoio à monitorização de doentes em regime de acompanhamento por equipas de Cuidados Continuados Integrados.
O ALICE, na forma como está estruturado e utilizando a tecnologia, permite detectar e actuar mais precocemente em contexto de doença aguda. Devido às recomendações de actuação que emite, via SMS ou chamada de voz automática, o ALICE permite domiciliar os cuidados, capacitar os cuidadores e diminuir o recurso às urgências hospitalares. (fonte isALICE)
É essencial que tanto a sociedade como os lares mudem rapidamente. Porque, de acordo com Carmen Garcia, “Nós sabemos pelos dados do Instituto Nacional de Estatística que, em 2080, vamos ter 317 velhos por cada 100 jovens. Isto é um rácio completamente desequilibrado. Se agora temos 180 velhos por cada 100 jovens e já não temos resposta, quando tivermos 317 a bolha vai rebentar.”