Lisboa, 31 ago (Lusa) - As bandas filarmónicas cresceram com o estigma do amadorismo, foram criadas para o povo dar música aos arraiais e romarias das aldeias, mas, hoje, a qualidade do repertório e da execução musical é melhor, defendem investigadores.
Atualmente, de acordo com a Confederação Musical Portuguesa, existem 720 bandas filarmónicas no ativo, muitas centenárias.
Em meados do século XIX, época a que remontam os registos das bandas mais antigas, as filarmónicas foram criadas por professores primários, as pessoas mais instruídas das aldeias, músicos e por padres, que queriam música nas festas religiosas.
A música, de acordo com o maestro André Granjo, que estudou o movimento das bandas de sopro em Portugal, "era uma forma de entretenimento, mas também um complemento do orçamento familiar" dos músicos, recrutados entre a classe trabalhadora, mais pobre e analfabeta.
André Granjo é maestro da União Filarmónica do Troviscal, que deu continuidade à Banda Escolar do Troviscal, fundada em 1911 pelo seu bisavô, que era maestro e professor, dava as aulas curriculares de manhã e ensinava música à tarde.
Segundo o músico, as bandas filarmónicas, em Portugal, apareceram, sobretudo, nos meios rurais e, ao contrário do Reino Unido, excecionalmente estiveram ligadas ao movimento operário, embora haja bons exemplos, como o da Sociedade Filarmónica Democrática Timbre Seixalense, fundada em 1848 e cujos músicos, operários da construção naval, foram ensinados e orientados por um padre.
Hoje, as bandas filarmónicas têm estudantes e licenciados, não só homens, mas também mulheres, e, por vezes, como a de Arcos de Valdevez, instrumentistas que, ao mesmo tempo, têm as profissões mais diversas, como a de médicos, arquitetos e engenheiros.
O maestro André Granjo assinala que a música das bandas, rapsódias e marchas por vezes mal interpretadas, era dirigida ao povo e executada por músicos amadores.
"Um estigma que marcou o repertório de sopro", vinca, sustentando que "a maior parte dos compositores não vê as bandas filarmónicas como veículo de expressão artística".
"A música de sopro estava ligada ao povo, fazia parte do povo e era praticada pelo povo", sintetiza. Por isso, ainda hoje, as bandas filarmónicas são conhecidas como "conservatórios do povo".
André Granjo admite, no entanto, que a sua qualidade artística melhorou. "Nunca tiveram maestros tão bem formados", frisa, recordando que há mestrados em direção de banda e licenciatura em direção de orquestra de sopro.
O maestro da União Filarmónica do Troviscal, e também da Orquestra de Sopros de Coimbra, realça, ainda, que os professores das escolas de música de sopro começam a compor para orquestra, influenciados por alunos que tocaram em bandas.
Graça Mota, docente na Escola Superior de Educação do Porto e autora-coordenadora do estudo "Crescer nas Bandas Filarmónicas", considera, igualmente, que a "qualidade musical" das bandas "tem vindo a aumentar". Não só fruto da formação de maestros, mas também dos arranjos e da composição de peças para filarmónicas.
Maria Helena Milheiro, que tem investigado o ensino da música nas bandas filarmónicas, destaca uma outra mudança, a das atuações na rua, em coretos, para os auditórios: "As bandas filarmónicas já vão para salas de espetáculo, com repertório próprio ou com repertório clássico adaptado".