Paris, 16 fev (Lusa) - A primeira biografia em francês da violoncelista portuguesa Guilhermina Suggia (1885-1950) chega às livrarias francesas a 05 de março com o título "La Suggia - L`Autre Violoncelliste", da autoria de Henri Gourdin.
O escritor francês disse à Lusa que o objetivo é fazer descobrir uma "personalidade injustamente desconhecida" em França, depois de ele próprio a ter descoberto quando escreveu uma biografia do violoncelista Pablo Casals, com quem Suggia viveu sete anos em Paris (de 1906 a 1913).
"Ela foi a primeira mulher a tocar violoncelo ao mais alto nível e a fazer carreira. Não foi fácil porque, na altura, o violoncelo era considerado um instrumento masculino. Ela teve de lutar contra esses preconceitos. Foi o charme da sua personalidade e a sua música que acabaram por convencer o público", explicou o autor.
Henri Gourdin destacou que "o que é impressionante nesta história é que a conquista do violoncelo pela mulher tenha sido feita por uma portuguesa, ainda que, na altura, Portugal fosse um país católico, onde a separação dos sexos era mais restrita do que noutro lado qualquer".
"Foi ela, uma portuguesa, que veio dar o exemplo aos franceses, aos ingleses, aos alemães e ao mundo inteiro. É extraordinário", continuou.
A capa do livro - que apresenta Suggia a tocar violoncelo de vestido vermelho e de olhos fechados - parte de um quadro de Augustus John, "o pintor das estrelas, que pintou as grandes personalidades artísticas e políticas da sua época" e que a representou "numa postura de diva", tendo contribuído para a criação de "uma lenda".
A "lenda" perpetuou-se, porque os instrumentos que Suggia tocou ficaram "para sempre conhecidos como o `Stradivarius Suggia e o `Montagnana Suggia`", e porque ela "legou os seus sete violoncelos a alunos e institutos, tendo os dois mais célebres - o `Montagnana` e o `Stradivarius` - sido vendidos para fundar os prémios Suggia, atribuídos anualmente a jovens violoncelistas", e garantir a sua formação.
Entre os distinguidos, contam-se, entre outros, Jacqueline du Pré, Rohan de Saram, Robert Cohen, Steven Isserlis, Raphael Wallfisch e Julian Lloyd Webber.
A carreira internacional de Guilhermina Suggia também passou por Paris, onde foi "o grande amor da vida de Pablo Casals", de acordo com Gourdin, que afirma ter sido "o primeiro a reconhecer, numa biografia de Casals, a importância de Suggia na vida dele".
O escritor foi à procura da residência onde o casal de músicos viveu, conhecida como "Villa Molitor" e surpreendeu "os proprietários atuais que não sabiam que Casals e Suggia aí tinham morado até receberem o telefonema" do escritor, que lamenta que, "em França, não haja nem violoncelo, nem placa comemorativa, nem nada que relembre os anos que Suggia passou em Paris".
A violoncelista tinha descoberto Pablo Casals pela mão do pai quando este a levou, "com apenas 13 anos, a um concerto no Casino de Espinho" e a apresentou ao músico catalão, então "com 21 anos".
Em Paris, foi na Salle Gaveau, nos números 15-17 rue de la Boetie que, a 07 de fevereiro de 1908, ela tocou como solista no primeiro concerto de Casals como maestro, mas o percurso comum inicial separar-se-ia ao fim de alguns anos e ela trocaria Paris pelo Reino Unido.
"É sempre muito difícil para dois artistas viverem juntos, sobretudo para dois violoncelistas. Há egos incompatíveis", aponto o escritor como provável motivo da separação.
"A segunda razão, a meu ver - prossegue -, é porque Suggia queria privilegiar a carreira musical. Naquela altura, uma mulher devia escolher entre a música ou os filhos. Como Casals queria ter filhos - e ela também de certa forma queria ser mãe - a dada altura ela teve de escolher e escolheu a música", concluiu Henri Gourdin.
O livro "La Suggia - L`autre violoncelliste", da editora "Les éditions de Paris", será apresentado a 16 abril, na Fundação Calouste Gulbenkian de Paris.