A vida dos patos está no centro da peça de David Mamet que estreia 5ªfeira em Almada, com música de Mário Laginha

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Lisboa, 26 Fev (Lusa) - Dois velhos encontram-se todos os dias num parque junto a um lago e discorrem longamente sobre a vida dos patos - assim se poderia resumir a peça do dramaturgo norte-americano David Mamet que estreia quinta-feira no Teatro de Almada.

"Duck Variations" (1972), no original, a peça de 14 cenas chama-se em português "Variações à Beira de um Lago", uma opção do encenador, Carlos Pimenta, que a justifica com uma interpretação menos cómica do texto que Mamet escreveu aos 25 anos, como uma reflexão mais filosófica sobre a vida.

"Podemos até imaginar que naquela cidade, aquele parque é uma espécie de simulacro da natureza, um excerto de natureza introduzido no meio do betão, e que aquele é o único momento do dia em que eles falam com alguém... e vão conversando sobre patos - os patos aqui são uma metáfora da sociedade e da vida - para se sentirem vivos", disse Carlos Pimenta.

Para os dois velhos, "é uma espécie de ritual", no âmbito do qual chegam a fazer um ao outro uma declaração de amizade, e "o terrível seria que, no dia seguinte, um deles não aparecesse", acrescentou.

Os patos de que eles falam são, simultaneamente, patos selvagens e patos do parque, "que vivem um pouco como os homens nas grandes cidades: vivem a desejar outra coisa, que não o que a cidade lhes dá, vivem nesse desejo de liberdade e de natureza que não existe nas cidades".

"A metáfora dos patos tem também que ver com a ideia de liberdade, com aquilo que as pessoas constroem socialmente, todos os códigos para se entenderem e para funcionarem, e que depois as aprisionam (...) os parques das grandes cidades são liberdades condicionadas", defendeu.

Os dois velhos, George e Emil, são encarnados pelos actores João Ricardo e André Gomes que, ao longo de uma hora, se movimentam num cenário criado por João Mendes Ribeiro, com um vídeo de Alexandre Azinheira, ao som de música original de Mário Laginha.

É a terceira vez que o compositor e pianista cria música para um espectáculo encenado por Carlos Pimenta.

"Aqui a ideia era colocar a música sempre entre variações, entre cada cena, só que depois o Carlos quis colar a primeira à segunda - não haver aí música e, então, daí saiu uma - e preferiu que, na morte do pato, aparecesse a música final - essa é a única que é inteira, que soa a canção inteira", explicou Laginha.

"Todas as outras é como se fossem pequenas variações - ao todo são 11. E é uma música que ao mesmo tempo tem um lado engraçado mas depois é meio escura", observou.

A "banda sonora" resultou de um processo de troca de ideias entre o compositor e o encenador e os actores, que lhe foram dizendo coisas sobre "como olhavam para a peça e como a viam e sentiam".

"Isso foi determinante para eu escrever a música", sublinhou Mário Laginha, acrescentando que gosta de compor para teatro.

"É sempre um desafio muito estimulante, porque eu normalmente faço música que é autónoma, que vive sem mais nada", comentou.

O espectáculo estará em cena até 30 de Março na sala experimental do Teatro Municipal de Almada, de quarta-feira a sábado às 21:30 e aos domingos às 16:00.

ANC.


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