Lisboa, 17 fev (Lusa) -- A investigadora portuguesa Maria do Céu Madureira recebeu uma bolsa da União Africana, no valor de um milhão de dólares, para estudar plantas medicinais e promover a sustentabilidade dos recursos florestais em São Tomé e Príncipe e Angola.
Em declarações à agência Lusa, a investigadora do Centro de Ecologia Funcional -- Departamento de Ciências da Vida da Universidade de Coimbra explicou que este financiamento vai permitir dar continuidade ao trabalho que vem desenvolvendo, sobretudo em São Tomé e Príncipe.
"Esta bolsa vai ser de três anos e vai abranger Angola e São Tomé, na vertente plantas medicinais e cogumelos, que podem ser medicinais ou alimentares. Vamos desenvolver fileiras de utilização racional destes produtos florestais, que existem nas florestas dos dois países", explicou.
A fazer investigação em São Tomé, sobretudo na ilha do Príncipe, desde 1993, a investigadora decidiu enveredar também por projetos que contribuíssem "para a manutenção do conhecimento tradicional e da sua transmissão oral para os mais novos" e evitassem "que os recursos fossem mal utilizados e de forma insustentável".
A investigadora trabalha diretamente com os terapeutas e curandeiros tradicionais, recebendo os seus conhecimentos sobre as plantas, muitas endémicas no Príncipe, e transmitindo-lhes também os resultados das suas investigações enquanto farmacêutica.
Maria do Céu Madureira vai coordenar uma equipa de investigadores do centro, ligados ao estudo dos microfungos e dos macrofungos e da área dos solos.
"Vamos tentar demonstrar que ao fazermos isto regeneramos os solos e regeneramos áreas perdidas de florestas e que podem ser economicamente utilizadas pelas comunidades para aumento das suas rendas familiares, é investigação aplicada que permitirá ver resultados nestes três anos", explicou.
Integrarão ainda a equipa elementos do Centro de Investigação Botânica da Universidade Agostinho Neto e do Centro Tecnológico, ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia de Angola.
Atualmente, a investigadora está também em contactos com o Salk Institute dos Estados Unidos para recomeçar um projeto iniciado em 2014 "com plantas da família das apocináceas que podem ter compostos ativos muito interessantes para o Alzheimer", uma descoberta que "pode representar um melhoria", não só para a população de São Tomé e Príncipe, "mas para todo o mundo".
"Existem aqui algumas plantas desta espécie, nomeadamente uma que ando atrás dela já há alguns anos que é endémica e nunca foi estudada", disse, acrescentando que está "muito perto" de a conseguir descrever, uma vez que na semana passada conseguiu encontrar a flor, o elemento que faltava estudar.
"Poderá ser descrita em breve e ser avaliado se tem os compostos para combater o Alzheimer", referiu a investigadora.
Maria do Céu Madureira liderou ainda um estudo sobre plantas com compostos para o combate à malária, nomeadamente o girassol-macho, "para beneficiar a população local e o objetivo era desenvolver esse composto como medicamento", mas o Governo são-tomense não avançou esse projeto.
Essa planta começou depois a ser estudada por muitos outros investigadores e foram descobertas "outras caraterísticas da mesma planta, como anti-inflamatórias, para a dor e mesmo anti-tumorais", disse a investigadora.
Maria do Céu Madureira vai receber o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, durante a deslocação que vai fazer ao Príncipe, no âmbito da visita de Estado que efetua a São Tomé e Príncipe entre 20 e 22 de fevereiro.
Agora que o Príncipe foi classificado pela UNESCO como Reserva Mundial da Biosfera, faz ainda mais sentido "preservar a biodiversidade e de fazer com que os utilizadores e vendedores de plantas medicinais consigam fazer as coisas como faziam os antigos, que respeitavam a floresta e só colhiam o que necessitavam", defendeu.
"O Presidente vai encontrar-se com um grupo muito interessante de curandeiros e terapeutas tradicionais e eles vão apresentar-lhe algumas das plantas sobre as quais temos trocado informações", disse.
A investigadora vai mostrar a Marcelo Rebelo de Sousa a entrada do parque natural do Príncipe, na Roça de Porto Real, para o Presidente "ficar debaixo da canópia florestal e mostrar-lhe algumas espécies que existem lá".
E Maria do Céu Madureira tem ainda reservada "uma surpresa" para Marcelo, que se escusou para já a revelar.