Autárquicas abrem porta a "noite das facas longas" no PSD

por RTP
Miguel A. Lopes - Lusa

Para lá da “maior vitória autárquica de sempre” para o PS, nas palavras de António Costa, os resultados das autárquicas representam uma derrota que está a abalar as estruturas da liderança do PSD. Pedro Passos Coelho foi defendido pelo seu coordenador autárquico, Carlos Carreiras, mas alguns nomes de peso social-democratas colocam em causa a sua liderança e as escolhas que fez para estas eleições, em particular colocar Teresa Leal Coelho na corrida para Lisboa, onde colheu uma derrota nunca vista na capital.

A primeira crítica chegou de Manuela Ferreira Leite, antiga líder do PSD que, aliás, disputou o partido com Passos Coelho. Em declarações à TVI, a antiga ministra das Finanças mostrou-se “atónita e chocada com os resultados demasiadamente maus” de Lisboa, considerando que Passos Coelho não tem condições para continuar à frente do partido.

Para Manuela Ferreira Leite, estes resultados são o toque de saída que Passos não pode deixar de ouvir, mas Carlos Carreiras, coordenador autárquico dos social-democratas, insistiu logo ao início da noite numa separação de águas para sublinhar que não há qualquer leitura que possa ser feita nestas autárquicas que leve a pensar na saída de Pedro Passos Coelho da liderança do PSD.Marques Mendes
O PSD “não é visto como uma oposição construtiva, [antes] muito negativa, com ressentimento, com a ideia de que vem aí o diabo”.


Questionada sobre se Passos Coelho tem condições para continuar a liderar o PSD, Manuela Ferreira Leite foi perentória: “Não, não tem”.

“A candidata por Lisboa [Teresa Leal Coelho] apareceu tardiamente, porque as estruturas que tinham de fazer a escolha não se entenderam e, ao aparecer tardiamente e como foi escolha do presidente do partido, é evidente que o presidente do partido também foi a eleições”, sublinhou a antiga governante, entendendo que “muitas pessoas não queriam votar no Pedro Passos Coelho e não votaram, por isso, no PSD”.

“Pedro Passos Coelho passou por uma fase difícil no Governo. (...) Não é fácil ser primeiro-ministro numa situação de resgate. Paulo Portas desapareceu inteligentemente, nunca mais ninguém o viu. A oposição feita ao PS apareceu simplesmente com a cara do Pedro Passos Coelho”, afirmou a antiga líder social-democrata.

Passos Coelho comentou entretanto ele próprio os resultados autárquicos, para admitir que se trata de “um dos piores resultados eleitorais de sempre” do PSD, o que, durante alguns minutos, fez pensar que poderia apresentar a sua demissão esta noite. Não foi o caso. Admitiu apenas não voltar a disputar a liderança do partido nas diretas do próximo ano.

“Farei uma reflexão aprofundada sobre as condições para me submeter a um novo mandato”, declarou aos jornalistas, explicando que essa reflexão será feita com a sua comissão política, mas será, sobretudo, uma reflexão pessoal. Antes de deixar a conferência de imprensa, fez questão de sublinhar: não se demite da presidência do PSD.
Carlos Carreiras defende o líder
Para já saiu a terreiro Carlos Carreiras. Em defesa do líder, o coordenador nacional autárquico do PSD tomou para si a responsabilidade dos resultados desta jornada eleitoral, ensaiando, face ao descalabro nas principais autarquias do país, que Portugal tem 308 municípios e “não é só Lisboa e Porto”.

Em declarações aos jornalistas na sede da São Caetano à Lapa, Carlos Carreiras retirou Passos do ponto de mira dos críticos, para sublinhar que “sempre disse que o principal responsável pelos resultados nestas eleições autárquicas em primeira linha é meu e será repartido em cada concelho pelos candidatos”.

“[Passos Coelho] não foi candidato a nenhuma câmara, a nenhuma freguesia”, reiterou o coordenador autárquico. “Foi candidato a eleições legislativas e foi líder de uma proposta que foi vencedora, não temos nenhuma razão para fazer extrapolação do nível local para novel nacional”.
Marques Mendes antevê “inferno”

Marques Mendes, antigo presidente do PSD que faz agora comentário político na televisão, chegou, ao início da noite, a admitir o anúncio de saída pelo próprio Passos.

Face aos resultados das autárquicas, a que se referiu como “uma hecatombe, um terremoto”, e à possibilidade de Passos se manter na liderança dos social-democratas, Marques Mendes anteviu que “a vida dele vai ser um inferno completo”.

Ademais, “vai ter dificuldade, numas diretas, de se manter na liderança”. Por isso, adiantou Marques Mendes, “não me surpreenderia muito que Passos Coelho tomasse a decisão, hoje ou terça-feira, quando tem um Conselho Nacional, de dizer que sai, de dizer que abandona, de dizer que sai de jogo e que dá o lugar a outro, por outras palavras, que não se candidata novamente à liderança do partido”. Um cenário que veio a confirmar-se uma hora depois.
Um ponto de fuga chamado Passos

Marques Mendes admite possa haver uma separação de águas quando nos referimos a eleições locais e lideranças partidárias. Abre, no entanto, uma exceção para estas autárquicas, porque, sublinha, “neste caso em concreto conjugam-se situações que todas vão dar a Passos Coelho”.

“Má escolha de candidatos, designadamente nos casos principais, Lisboa e Porto, onde a derrocada é monumental, uma decisão foi do líder (…), houve campanha muito nacionalizada, que não favorecia o PSD - foi uma escolha do líder, errada (…) em terceiro lugar, há de facto aqui uma penalização pela forma de se fazer oposição”, concretizou o comentador.

Também Mauro Xavier, antigo presidente da concelhia do PSD/Lisboa que se demitiu por discordar da estratégia do partido com a escolha de Leal Coelho, já exigiu a Passos Coelho que assuma a “responsabilidade política” pelos resultados.

“A opção de Pedro Passos Coelho na escolha do candidato do PSD a Lisboa teve uma resposta clara do eleitorado. Demiti-me por não concordar com esta opção. Cabe-me pedir agora responsabilidades ao presidente do partido. Espero que o PSD não faça o mesmo que o Governo fez com o caso de Tancos e alguém assuma a responsabilidade política”, escreveu na sua página de Facebook.
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