Turquia e União Europeia selam acordo para devolução de migrantes

por Andreia Martins - RTP
Yannis Behrakis - Reuters

Os líderes europeus e a Turquia chegaram esta sexta-feira a um entendimento sobre o mecanismo de devolução dos refugiados. Todos os migrantes que cheguem às ilhas gregas depois de domingo, dia 20 de março, vão ser reenviados para a Turquia a partir de 4 de abril.

Acordo com luz verde após "decisão unânime" dos Estados-membros. Bruxelas e Ancara tentam eliminar por completo as rotas de imigração ilegal e implementam as medidas que causaram grande celeuma do ponto de vista político e humanitário durante as últimas duas semanas.

O acordo foi alcançado após uma manhã de conversações com Ahmet Davutoglu, o primeiro-ministro turco e depois de Donald Tusk, o Presidente do Conselho Europeu, ter recomendado a todos os líderes que aprovassem o texto sem fazer qualquer emenda, de forma a conseguir a sua implementação.

Reunidos para um almoço de conversações, os representantes dos 28 Estados-membros chegaram rapidamente a acordo.

A questão dos refugiados dominou por completo a cimeira europeia, que decorreu esta quinta e sexta-feira, em Bruxelas. Na nota publicada pelo Conselho Europeu ao início da tarde, a ajuda humanitária e o plano de ação conjunta são explicados. Mas Bruxelas não esquece as fragilidades democráticas apontadas ao seu parceiro.

"A União Europeia espera que a Turquia respeite os mais elevados padrões no que diz respeito à democracia, Estado de Direito e respeito pelas liberdades fundamentais, incluindo a liberdade de expressão", lembra o comunidado.

No rascunho da declaração entregue aos líderes europeus, divulgado ao início da tarde desta sexta-feira pelas agências internacionais, documento exclusivamente dedicado à explicação dos termos de um acordo, reconhece-se que “são necessários mais esforços” para gerir a crise de refugiados.

O primeiro ponto visa precisamente uma "declaração de guerra" à imigração ilegal. Os líderes comprometem-se a "romper com o modelo de negócio dos traficantes" e oferecer aos migrantes um caminho alternativo que não implique "colocarem as suas vidas em risco".
Plano entra em vigor no domingo
Para esse efeito, todos os migrantes que cheguem às ilhas gregas por vias ilegais já a partir do próximo domingo, dia 20 de março, serão devolvidos à Turquia. Bruxelas refere que este processo vai decorrer em total concordância com as diretivas europeias e a lei internacional, e por isso não se trata de  nenhuma "expulsão coletiva", garantem os responsáveis europeus.

Ainda mais se sublinha que esta é uma medida "temporária e extraordinária", e que apenas se justifica porque vai permitir "por um fim ao sofrimento humano" e "reestabelecer a ordem pública".

O custo destas operações de retorno de pessoas e as respetivas viagens de regresso desde a Grécia até à Turquia será da exclusiva responsabilidade da União Europeia, um valor que se junta aos seis mil milhões de euros de euros em ajudas financeiras que serão entregues a Ancara até ao fim de 2018.
Um sírio por um sírio
Tal como proposto no Conselho Europeu de 7 de março, a Europa deverá acolher um refugiado sírio que está na Turquia, pelas vias legais, por cada sírio que seja enviado da Grécia para a Turquia, proposta formulada na frase “um sírio por um sírio”.

Na atribuição de asilo, as autoridades europeias sublinham que vão dar prioridade a todos os migrantes que não tenham arriscado a travessia através do mar Egeu ou entrado por qualquer outro meio ilegal.

A Turquia reconhece-se ainda na obrigação de tomar todas as medidas necessárias para eliminar novas rotas de travessia.

Para além da ajuda financeira, Ancara tinha apresentado como exigência a antecipação da liberalização dos vistos europeus a cidadãos turcos. Bruxelas cedeu neste ponto e promete acelerar o processo até junho de 2016. Já a questão do retorno das negociações para a adesão à União Europeia não é sequer mencionada no texto.
"Excesso de ilusões"
No final da cimeira conjunta, o primeiro-ministro português foi um dos líderes a comentar os pontos deste acordo, considerando que se trata de um passo "muito importante", já que permite conceder "proteção internacional a quem dela carece" e por outro lado "responder à situação de crise humanitária que se vive na Grécia", agora que foi clarificado que não haverá qualquer tipo de "expulsão coletiva".
Raquel Morão Lopes, Antena 1

António Costa adverte no entanto que este acordo "não deve ser visto com a ilusão de que o problema está resolvido", até porque poderão surgir novas rotas no futuro, nomeadamente através da Líbia. A responsável pela diplomacia europeia, federica Mogherini, alertou esta semana os líderes europeus para a necessidade de se precaver uma nova rota de migração vinda pela Líbia.

Sobre a questão cipriota, implícita no documento conhecido pela imprensa e que ameaçou o voto de unanimidade pelo lado europeu, o representante português em Bruxelas "salvaguarda as legítimas aspirações de Chipre no seu processo de reconhecimento internacional".

Angela Merkel, a chanceller alemã, que tem assumido um papel proeminente na resolução da maior crise de refugiados desde o fim da II Guerra Mundial, refere que não tem quaisquer ilusões quanto a este acordo, admitindo que o mesmo terá "retrocessos e desafios legais".

Mais otimista parece ser a posição do primeiro-ministro turco, Ahmed Davutoglu, que fala num dia "histórico" para a Turquia e para a União Europeia.
"Dachau dos tempos modernos"
Tendo em conta a atual situação em que se encontra a Grécia, o Conselho Europeu convida todos os Estados-membros a ajudar aquele país, que acolhe atualmente mais de 46 mil migrantes, fruto do encerramento de fronteira levado a cabo pelos Balcãs. Mas não traduz esta ajuda em medidas concretas e urgentes de apoio, como muito esperavam as autoridades gregas.

No campo de refugiados de Idomeni, no norte da Grécia, a situação complica-se a cada dia que passa, e há já quem o compare aos campos de extreminação da Alemanha nazi.

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"Não hesito em dizer que isto é um Dachau dos tempos modernos, um resultado da lógica de fechar fronteiras", disse o ministro grego do Interior durante uma visita ao campo, esta sexta-feira.
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Derradeira oportunidade
Enquanto surgiam as primeiras notícias deste mesmo acordo, ao início da tarde de sexta-feira, as autoridades turcas desencadearam uma grande operação que ainda foi a tempo de intercetar milhares de migrantes que tentavam chegar à ilha de Lesbos.

A operação, com recurso a helicópteros e com a participação da guarda-costeira turca, acontece a dois dias da entrada em vigor deste acordo que prevê o retorno obrigatório de todos aqueles que arriscam a travessia por vias ilegais.
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