Maputo, 30 abr (Lusa) - O terceiro partido moçambicano no parlamento, Movimento Democrático de Moçambique (MDM), exige o envolvimento da justiça e da Assembleia da República no esclarecimento da revelação de uma vala comum no centro do país.
Daviz Simango, líder do MDM, disse à Lusa que o relato revelado na quinta-feira sobre a descoberta por um grupo de camponeses de uma vala comum de mais de cem corpos na Gorongosa, província de Sofala, está alinhado com as informações em posse do seu partido e o desaparecimento de pessoas na região, mas que "as autoridades vão sempre desmentir".
O dirigente da oposição avançou que vai enviar uma equipa ao local, apesar das limitações de segurança impostas pelo atual conflito militar, mencionando que, entre desaparecimentos registados pelo MDM na região de membros de partidos políticos e cidadãos também constam efetivos da sua força política há quase um mês.
"Tudo isso se passa na Gorongosa", frisou Simango, também autarca da Beira, capital da província de Sofala, exigindo investigações não só do parlamento como também da Procuradoria-Geral da República, "que tem meios e proteção para chegar ao local em condições de segurança".
A zona é descrita como de difícil acesso e de risco elevado, dada a presença de militares no contexto da atual crise militar que opõe as forças do Governo e a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), maior partido de oposição.
O administrador da Gorongosa contrariou na sexta-feira o relato de um grupo de camponeses que asseguraram à Lusa terem observado uma vala comum com mais de cem cadáveres na zona 76, posto administrativo de Canda, no distrito da Gorongosa.
Segundo Manuel Jamaca, uma equipa do governo distrital foi enviada ao local, mas não encontrou nada.
A polícia de Sofala anunciou que vai iniciar uma investigação para apurar a veracidade da descoberta.
"Há muita coisa a acontecer e muita gente a morrer em circunstâncias terríveis", declarou o líder do MDM, considerando que um dos desafios do país é "a grande ausência de verdade e autonomia de justiça no terreno".
Um dos três camponeses ouvidos pela Lusa descreveu que "a vala tem cerca de 120 corpos, uns já em ossadas e outros ainda em decomposição", sem precisar se tinham marcas de balas, suspeitando apenas que foram descarregados por viaturas devido a sinais de manobras no local.
"Não há vestígios militares visíveis e alguns corpos estão sem roupas", descreveu um dos camponeses.
Apesar de não haver qualquer indício que relacione esta vala com a atual crise militar em Moçambique, um outro camponês que esteve no local lembrou a onda de perseguição e execuções por razões políticas e que a região tem sido palco de combates entre a ala militar da Renamo e as forças governamentais.
Para Daviz Simango, a existência de valas comuns em Moçambique "não é novidade", referindo-se ao período da guerra civil (até 1992), e observou que, apesar de no passado haver casos similares, "as autoridades já não se interessam".
A Comissão de Direitos Humanos de Moçambique (CDHM) disse à Lusa na sexta-feira que quer apurar a veracidade dos relatos da descoberta da alegada vala comum, adiantado que, a confirmar-se, é um caso "muito preocupante" e instando o Ministério Público também a investigar.
A Renamo e as forças do Governo mantêm confrontos no centro do país desde 2013, com especial incidência na região da Gorongosa, onde se presume encontrar-se o líder da oposição, Afonso Dhlakama.
No contexto desta crise, que se agravou nos últimos meses, há vários registos de confrontos militares entre as partes, mas nenhuma informação nem imagens sobre as respetivas baixas.
"Não há imagens porque os mortos são escondidos para não dar informações sobre baixas", comentou Daviz Simango, sustentando que se trata de uma questão de direitos humanos, em que "as famílias têm o direito de fazer funerais condignos" e que são incompatíveis com valas comuns.