Com 94 anos, morreu na semana passada em Berlim Fritz Teppich. Judeu alemão, emigrado em consequência da tomada do poder pelo nazismo, combateu na Guerra Civil de Espanha e esteve mais tarde refugiado em Portugal.
Combatente da Guerra de Espanha Na Bélgica, o jovem aprendeu a profissão de cozinheiro e aderiu à Juventude Socialista. Em Julho de 1936, quando os militares espanhois se sublevaram, partiu imediatamente para defender a República. Chegou logo no começo, quando ainda não havia Brigadas Internacionais. Aos 17 anos, ficou ao serviço do exército republicano.
Enviado para a frente basca, viveu o colapso desta e testemunhou a cumplicidade de boa parte da burguesia basca com as tropas franquistas. No bombardeamento de Guernika perdeu uma amiga de quem nunca mais soube se tinha sobrevivido. Quando a frente basca foi evacuada, partiu de barco para França, em circunstâncias aventurosas, que recorda na sua autobiografia ("Der rote Pfadfinder").
Para muitos, derrotados e evacuados, a guerra terminou nesse momento. Mas Teppich voltou a Espanha. Combateu noutras frentes tão mortíferas como a de Teruel e, apesar da sua pouca idade, chegou a capitão do Exército Popular. Politicamente evoluíra do socialismo belga para o comunismo espanhol, tendo-se tornado militante do PCE.
No colpaso final da forças republicanas, partindo de Alicante, atravessou a pé grande parte da Espanha com o objectivo de se refugiar em França. Foi capturado, conseguiu escapar e conseguiu finalmente chegar a França. Aí permaneceu até à invasão nazi de Junho de 1940.
Exilado em Portugal Veio então para Portugal, onde permaneceu em situação precária. Foi detido pela PVDE e esteve algum tempo no Aljube, onde conheceu vários dirigentes do PCP, com especial realce para Joaquim Pires Jorge, de quem se tornou amigo e que recorda no seu livro de memórias.
Foi depois libertado e ficou a viver, com residência fixa, na Ericeira. Esta cidade viria a homenageá-lo, já nos anos 90, com uma sessão pública e com a publicação em português da parte do seu livro referente ao período de exílio em Portugal.
Depois da Guerra, Teppich regressou à Alemanha e ficou a viver em Berlim Ocidental, onde trabalhava como jornalista. Manteve-se sempre politicamente activo e continuou a definir-se como comunista. Depois do 25 de Abril, era presença frequente nas festas do "Avante".
O caso da herança Kempinski Uma das várias campanhas públicas que animou foi contra a utilização do nome Kempinski pela cadeia de hoteis que tinha sido da sua irmã e do seu cunhado. Esta cadeia fora tomada pelo Estado no tempo do nazismo, ao abrigo das leis de "arianização" da propriedade. Com o final da Guerra, o Estado leste-alemão conservou nas suas mãos o conjunto da economia e, portanto, também essa cadeia de hoteis.
Teppich nada objectou, porque apoiava a estatização da economia. Mas, após a unificação alemã de 1991, protestou energicamente contra a privatização sob o mesmo nome que tinha sido o da cadeia de hoteis antes da nacionalização nazi: Kempinski. Não queria ser indemnizado, mas também não aceitava que se mantivesse o nome passando uma esponja sobre as vicissitudes que tinham marcado a história da empresa.
O Estado alemão unificado não reagiu aos seus protestos e o mais que Teppich conseguiu foi a colocação de uma placa evocativa num dos hoteis Kempinski.
Um comunista na Alemanha capitalista Com a unificação alemã culminava também a crise da RDA e o fracasso de um projecto político em que Fritz Teppich tinha confiado. Embora continuasse a ser comunista, ele foi, no entanto, solidário com os mineiros de Bischofferode, que tinham votado na democracia-cristã. Para além das distâncias ideológicas, estava a realidade da mina privatizada e encerrada, para consolidar a quota de mercado da BASF. E Teppich viu-se assim a fazer greve de fome para apoiar os mineiros de quem o separavam profundas divergências.
A RTP deu a conhecer ao público português a história do exílio de Fritz Teppich na Ericeira, entrevistando-o nessa vila piscatória durante uma das suas frequentes visitas a Portugal. E voltou depois ao tema, através de uma entrevista na RTP-Memória, feita pelo autor destas linhas a um seu biógrafo, Thomas Behrens.