Merkel ensaia castigo a Cameron a partir do Parlamento alemão

por Carlos Santos Neves - RTP
Angela Merkel conversa com o ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble, durante a sessão parlamentar da manhã desta terça-feira Kay Nietfeld - EPA

A chanceler alemã aproveitou esta terça-feira uma intervenção perante a câmara baixa do Parlamento de Berlim para multiplicar avisos ao Reino Unido. A poucas horas do início de uma reunião do Conselho Europeu dedicada ao desfecho do referendo britânico, em Bruxelas, Angela Merkel voltou a condicionar as conversações à invocação do artigo 50.º do Tratado de Lisboa. E advertiu David Cameron contra uma negociação à la carte.

“Quem sai da família não pode esperar que todos os seus deveres desapareçam e que os privilégios se mantenham”, atirou Merkel esta manhã, a partir do púlpito do Bundestag.“Percebemos como é crítico que os restantes 27 países da União Europeia demonstrem que têm vontade e são capazes de dar os passos corretos em frente”, clamou Merkel no Parlamento alemão.


Numa intervenção que decorreu a par de uma sessão extraordinária do Parlamento Europeu, precisamente sobre a saída do Reino Unido da União Europeia, a chanceler alemã deixou antever aquela que deverá ser a sua postura na reunião do Conselho Europeu.

O Governo britânico, antecipou Angela Merkel, não pode esperar, pelo menos da parte do diretório germânico, nenhum tratamento especial. Porque a Alemanha tratará de garantir que “as negociações não se desenrolem de acordo com o princípio da escolha à la carte”.

“A União Europeia é suficientemente forte para ultrapassar a partida da Grã-Bretanha, é suficientemente forte para continuar a avançar, mesmo com 27 membros”, carregou a governante alemã.



Na véspera da cimeira europeia, Merkel fizera já saber que não estaria disponível para viabilizar quaisquer negociações “formais ou informais” sobre as modalidades do Brexit antes da invocação do artigo 50.º do Tratado de Lisboa: a porta de saída da União.

”Estamos de acordo. Não haverá discussões formais ou informais sobre a saída da Grã-Bretanha da União Europeia enquanto não houver um pedido de saída da União Europeia a nível do Conselho Europeu”, avisava ontem a chanceler após um encontro com o Presidente francês, François Hollande, e o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi.
A reforma

Ainda segundo Angela Merkel, “qualquer proposta que permita uma saída da crise da União Europeia, mantendo os 27, é bem-vinda”.Também o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, exortou, no Parlamento Europeu, o Reino Unido a “clarificar o mais rapidamente possível a situação” pós-referendo.

“Hoje e amanhã temos a oportunidade de ter essa discussão com os outros chefes de Estado e de governo. O objetivo deve ser chegar a um resultado comum, o mais tardar para o 60.º aniversário do Tratado de Roma, em março do próximo ano”, acrescentou a chanceler alemã, referindo-se ao tratado fundador do projeto europeu, a propósito da reforma da União.

Merkel deixaria outro aviso ao Reino Unido: se o país quiser conservar o acesso ao mercado único, terá de respeitar, desde logo, o princípio da livre circulação.

“Um acesso livre ao mercado único é atribuído a quem respeita estas quatro liberdades fundamentais: pessoas, bens, serviços e capitais”, enunciou.
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