Jurista português dá razão à "Nino" Vieira ao demitir governo

por Agência LUSA

O jurista português Jorge Bacelar Gouveia afirmou segunda-feira em Bissau que o presidente guineense teve razão ao demitir o governo de Carlos Gomes Júnior e nomear Aristides Gomes para o cargo de primeiro-ministro.

Falando nas primeiras tertúlias organizadas pela Universidade Amílcar Cabral (UAC), Bacelar Gouveia reconheceu "justeza" na decisão de João Bernardo "Nino" Vieira, alegando os poderes constitucionais que a lei confere ao chefe de Estado à luz da crise política.

Segundo o jurista português, a lei fundamental guineense reserva ao presidente da República não só os poderes de fiscalização do funcionamento das instituições como também velar pela criação de condições de exercício parlamentar que dêem garantias de estabilidade ao governo.

Perante os recentes cenários que se apresentaram a "Nino" Vieira, o jurista português não tem "a menor duvida" em como o presidente guineense não incorreu em nenhum acto anti-constitucional quando destituiu o governo de Carlos Gomes Júnior e chamou Aristides Gomes para o seu lugar.

Bacelar Gouveia sublinhou que "Nino" Vieira agiu em conformidade com a lei fundamental guineense por ter, alegadamente, obedecido aos critérios constitucionais, na medida em que "não está escrito de forma tácita" que o presidente da República deve escolher o primeiro-ministro apenas entre os dirigentes do partido maioritário no parlamento.

"É verdade que é provável que dependa do partido maioritário a constituição de uma maioria no Parlamento, mas nem sempre assim sucede", afirmou Bacelar Gouveia, dando como exemplo o caso ocorrido em Portugal, quando o presidente Jorge Sampaio decidiu dissolver o Parlamento convocando eleições antecipadas.

Na altura da dissolução do parlamento português, lembrou Bacelar Gouveia, a "maioria factual" era detida pela coligação entre o Partido Social-Democrata (PSD) e Centro Democrático Social/Partido popular (CDS/PP).

No entanto, o chefe de Estado português optou pela convocação de eleições antecipadas, porque "não sentia garantias" de estabilidade governativa por parte das duas forças maioritárias.

Tanto na situação em Portugal como na da Guiné-Bissau, o jurista português é de opinião de que cabe ao chefe de Estado fazer "uma análise de geometria variável" quando colocado perante cenários do género, onde, de facto, um partido possui uma maioria relativa no parlamento, mas não está em condições de oferecer ao país garantias de estabilidade parlamentar.

"O chefe de Estado, aí, tem de ver qual o peso relativo dos partidos, quem esses partidos vão apresentar para primeiro-ministro e se essas figuras vão fazer coligações ou não e como vai ser com o Programa do Governo", destacou.

Jorge Bacelar Gouveia afirmou ainda que nas conjecturas do chefe do Estado conta muito a "análise dinâmica prospectiva" sobre como as maiorias vão funcionar no parlamento para assegurar a estabilidade governativa.

Outra ideia defendida pelo jurista português prende-se com o caso ocorrido em 1997, quando "Nino" Vieira foi obrigado pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ) a voltar atrás com a sua decisão de nomear Carlos Correia primeiro-ministro, sem ter consultado previamente os partidos com representação parlamentar.

Para Bacelar Gouveia, na altura, o STJ cometeu um erro porque, por um lado, a lei não diz "forçosamente" que o presidente da República deve ouvir os partidos antes de nomear um chefe do governo, e, por outro, não dá poderes constitucionais ao Supremo para exercer uma fiscalização abstracta sobre a acção directa prevista no regimento parlamentar.

"O Tribunal errou em 1997 e não deve cair no mesmo erro agora.

Até porque os juízes já não são os mesmos. As questões também são diferentes. Em 1997 era uma questão clara e segura, que era a omissão de o presidente da República em ouvir os partidos. Agora, é uma questão discricionária nos poderes do presidente em interpretar aquilo que é uma crise politica e aquilo que é o resultado eleitoral como condição para a escolha do governo", defendeu Bacelar Gouveia.

A "tertúlia", promovida pela UAC, decorreu sob o lema "Democracia, Partidos Políticos e Estado de Direito na Guiné-Bissau - Reflexões sobre o Sistema Político-Constitucional" e visa dar maior amplitude aos debates sobre temas importantes da vida guineense, disse à Agência Lusa Ricardo Godinho Gomes, director dos Recursos Humanos da universidade, cujo antigo reitor, Tcherno Djaló, é o actual ministro da Educação e Ensino Superior.

PUB