"Escolas católicas não podem ser discriminadas"

por Rosário Lira - RTP
"A ideologia antirreligiosa depende desta tendência que há na Europa e no mundo ocidental de excluir Deus da vida pública" RTP

O presidente da Congregação para a Educação Católica do Vaticano lembra que as escolas católicas prestam um serviço público e não devem ser discriminadas pelos Estados no apoio que dão. Considera que falta liberdade na educação. As democracias ocidentais estão cada vez mais subjugadas ao positivismo científico que impede os pais de darem aos filhos uma educação igualmente aberta aos valores transcendentes. Aponta o desemprego juvenil como uma das principais preocupações e acusa as gerações atuais de subtraírem o futuro dos mais novos.

O presidente da Congregação para a Educação Católica na Cúria Romana lamenta que haja uma discriminação ideológica em relação às escolas privadas católicas. Sem querer falar especificamente sobre a situação em Portugal e em concreto do fim do apoio do Estado aos privados, nesta entrevista exclusiva ao site da RTP e à Antena1, o cardeal Giuseppe Versaldi foi adiantando que "em toda a Europa e sobretudo nalguns países como a Itália, há esta discriminação ideológica de pensar as escolas católicas como escolas privadas. As do Estado são privadas mas não tem como objetivo o lucro, não fazem para ter lucro, mas para prosseguir a missão de poder instruir toda a população, todos os jovens".

Para o cardeal italiano, esta situação também se reflete no ensino porque "a ideologia antirreligiosa depende desta tendência que há na Europa e no mundo ocidental de excluir Deus da vida pública e considerar que só em nome da ciência se devem ensinar aquelas matérias que reduzem a razão ao âmbito imanente, limitando cada discurso àquilo que transcende os fenómenos mensuráveis das ciências modernas".

Esta discriminação, adianta o responsável pela Educação católica da Santa Sé, "tem por consequência uma redução do apoio que o Estado dá às escolas católicas por serem consideradas privadas, apesar de prestarem um serviço público".

Atualmente a Igreja tem em todo o mundo, 214 mil escolas católicas com um total de 59 milhões de alunos, 1.365 universidades, com dez milhões de alunos e 500 faculdades eclesiásticas. Um número que se tem mantido estável na Europa mas que tem vindo a aumentar na Ásia e em África.

Segundo o cardeal Giuseppe Versaldi, todos têm direito à educação e não deve existir uma discriminação em função do dinheiro. "O dinheiro, como diz o Papa, é um instrumento que tem um poder que discrimina e traz desigualdade. A missão da Igreja é sobretudo ajudar as gerações de jovens mais pobres a aceder à educação", refere. Neste sentido salienta em particular o trabalho realizado em África e na Ásia como sendo de "vanguarda" porque considera a educação "não só para os ricos, não só para os católicos mas para todos em nome da dignidade da pessoa humana".

O presidente da Congregação para a Educação Católica lembra como é importante o papel da família na educação "mesmo antes do Estado e da Igreja" mas admite que as famílias acabam muitas vezes por ver a sua liberdade de opção limitada porque a oferta que existe é restritiva e não abrange determinados valores que para a Igreja são essenciais.

A este propósito o cardeal adianta que "o conceito de liberdade tão proclamado na democracia ocidental tem vindo a ser sacrificado em nome de um nivelamento da cultura ao positivismo científico que impede os pais de poderem dar aos filhos uma educação igualmente aberta aos valores transcendentes. A família tem direito a que os filhos sejam educados segundo as suas convenções próprias, incluindo as religiosas, não só positivistas terrenas mas que deem também resposta às interrogações transcendentes que existem no coração humano." E conclui: "A família deve ser mais respeitada e mais ajudada em nome da liberdade e da democracia".

Particularmente atento aos jovens e à sua integração na sociedade, o cardeal Giuseppe Versaldi vê no desemprego jovem um dos principais problemas da sociedade atual, "a imersão da ponta do iceberg de uma sociedade envelhecida na cultura e nos valores".

Para o cardeal italiano "os jovens sentem-se excluídos desta sociedade que é cada vez mais egoísta e que procura defender o que adquiriu e também aquilo que foi subtraindo para o futuro das gerações que consumiram mais do que produziram". Neste sentido, conclui que "há uma desigualdade geracional que deve ser corrigida através de uma renovação". Essa renovação tem de ser feita nas escolas e nas universidades. Caso contrário considera que se vai estar sempre "a repetir o passado" sem que haja um efetivo progresso intelectual da pessoa.

Versaldi espera que as universidades possam dar o seu contributo de renovação para "um mundo que precisa de esperança" porque, adianta, "a situação atual parece fechar muitas vezes esta janela de renovação e os jovens, sobretudo, sofrem com isso. Como as escolas e as universidades são feitas de jovens, este é o campo critico onde há ou não renovação e o progresso do mundo".

Outra das preocupações da Congregação para a Educação é formação dos professores. Na sequência do Congresso Mundial sobre a Educação Católica que decorreu o ano passado, o cardeal Giuseppe Versaldi revelou que está a ser preparado um documento com orientações gerais para todas as comunidades e que dá particular atenção à identidade da escola católica e à formação dos professores.

Os professores, segundo Versaldi, têm de ser formadores para uma "educação integral, não apenas intelectual ou a pensar na eficiência económica mas que traga aos jovens um real e pleno desenvolvimento das suas capacidades, do seu potencial e dos valores que devem ser a base da vida individual e social", conclui.
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