Registos paleolíticos de seres humanos com mais de 40.000 anos são relativamente raros. Sobretudo no Ártico Euroasiático, onde, no máximo, chegam aos 30.000 a 35.000 AC. Agora, uma carcaça de mamute congelada prova que os humanos viveram e sobreviveram no Ártico 10 mil anos antes disso.
Os restos foram encontrados em 2012 por uma equipa de cientistas em Yenisey Bay. Sobressaíam dos sedimentos da tundra e, concluíram as análises, tinham cerca de 45.000 anos, algo que não é especialmente estranho.
Nos últimos 20 anos o degelo da camada de permafrost tem posto a descoberto os restos de centenas de animais, mamutes mas também rinocerontes-lanudos e até trigres de dentes-de-sabre, permitindo abrir todo um novo capítulo na história da evolução.
O mais significativo da descoberta de 2012, contudo, foram as marcas que a carcaça apresentava nos ossos, consistentes com ferimentos provocados por objetos.
As marcas, afirmam os pesquisadores, mostram indícios claros de terem sido infligidas por armas construídas e manuseadas por humanos. Apesar de não ter sido encontrada nenhuma prova humana associada à carcaça, são consistentes com marcas encontradas noutros ossos e que foram já atribuídas ao Homem.
A descoberta significa por isso que a ocupação humana do Ártico terá de ser datada 10.000 anos mais cedo do que se pensava. As conclusões foram publicadas na revista Science.
Um inimigo poderoso
A própria carcaça mantinha algum tecido preservado, incluindo restos da sua bossa de gordura e do seu pénis. Isto não só dá provas conclusivas do sexo do animal, mas indica também que estava no pico de forma e que tinha cerca de 15 anos - um inimigo formidável.
O esqueleto apresenta marcas de ferimentos na mandíbula e na cabeça e os cientistas suspeitam que poderão ter sido causados por golpes infligidos na tromba e na cabeça, talvez para tentar atingir artérias e semelhantes aos usados ainda hoje por algumas tribos de recoletores-caçadores caçadoras de elefantes.
Outros ferimentos incluem golpes e marcas nas costelas e omoplatas, como se os caçadores estivessem a tentar atingir órgãos internos. Uma parece ter atingido a espinha, quebrando-a.
Um salto cultural
Neste período, a população de mamutes aumentava à medida que os lençóis de gelo recuavam e também os humanos que os seguiam se expandiam em número, explorando a sua crescente base de presas.
As provas agora recolhidas sugerem, afirmam os autores do estudo, que a migração dos humanos pelo Ártico se deveu em parte a desenvolvimentos na arte de caçar mamutes.
Há quem avance a hipótese de que isto implique que a expansão dos humanos para norte se tenha ficado a dever a mudanças culturais importantes naquele período.
Ajudará também a explicar como e quando é que os humanos começaram a viver perto da ligação terrestre do Estreito de Bering, que viriam a atravessar a caminho da América do Norte.
Os restos de um lobo caçado numa localidade totalmente diferente, numa idade semelhante, indicam igualmente que os seres humanos deverão ter-se espalhado pelo norte da Sibéria 10.000 anos antes do que se pensava até agora.