Quarenta e cinco entidades constituíram, em Rio Maior, a Rede Portuguesa de Economia Solidária, para reunir organizações e pessoas que se reveem num conceito de economia ecocêntrica, que vê o Homem como parte da natureza, segundo um dos fundadores.
Rogério Roque Amaro, orador do colóquio "Economia Solidária -- Pertinências e Desafios de um conceito e de práticas inovadoras" - que se realiza na sexta-feira à noite no Fórum Actor Mário Viegas, integrado nas comemorações dos 35 anos do Centro Cultural Regional de Santarém - disse à Lusa que, embora ainda não constituída juridicamente, a Rede Portuguesa de Economia Solidária (RPES) é já uma realidade.
Com 23 entidades individuais e 22 organizações como membros fundadores, a RPES esteve representada na Feira de Economia Solidária da Catalunha (Espanha), que se realizou em Barcelona entre 23 e 25 de outubro, estando em curso a adesão à Rede Europeia de Economia Solidária, um `braço` da Rede Intercontinental de Promoção da Economia Solidária, surgida em 1997 em Lima, no Peru.
Numa assembleia realizada a 17 de outubro, foi escolhido o logotipo e apresentado o blogue da RPES (https://rpespt.wordpress.com/).
"Economia solidária é um conceito e uma prática relativamente recente em Portugal continental e ainda não bem assimilado nem muito reconhecido", disse Roque Amaro à Lusa, assinalando que nos Açores esta "economia alternativa" é uma realidade há mais de três décadas.
A região foi pioneira em práticas que visaram dar resposta a situações de pobreza extrema, dos expatriados e de jovens para os quais não havia respostas da "economia dominante", muitas vezes "geradora desses problemas".
O aparecimento de trabalhos de investigação, a intervenção no terreno de organizações como a Cooperativa Terra Chã - que, na aldeia de Chãos, desenvolve iniciativas que se inserem no conceito de economia solidária, com a revitalização de valores culturais e ambientais e promovendo o "regresso à aldeia" - e o "número crescente de organizações e pessoas fora dos núcleos universitários que começam a ter a economia solidária como referência" levaram à constituição da rede, apontou o responsável.
A RPES teve a sua assembleia fundadora a 08 de agosto, em Chãos, da qual saiu um manifesto que justifica o aparecimento da rede "num momento crucial, em que as várias crises (económicas, financeiras, sociais, ambientais, políticas, civilizacionais e de conhecimento) têm provocado inúmeros sofrimentos e indignidades (sociais, ambientais, culturais, económicas e políticas)".
"As profundas fragilidades e falhas das formas económicas e políticas dominantes estão a tornar-se ameaças e problemas preocupantes para o futuro da Humanidade e da vida no planeta e a pôr em causa valores essenciais como a solidariedade, a equidade, a democracia e a transparência", refere o manifesto.
Roque Amaro afirmou que o conceito e a prática da economia solidária surgiram como alternativa para assegurar esses valores "em várias geografias - América Latina, Canadá, Europa e atualmente também na América do Norte".
O professor do Departamento de Economia do ISCTE - Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa e coordenador do curso de pós-graduação e mestrado em Economia Social e Solidária sublinha que a economia solidária procura recuperar dimensões da economia social que se foram perdendo com a assunção por esta de um caráter mais assistencialista e próximo da economia de mercado.
"A economia solidária não se envergonha de ser economia, quer ser, mas quer ser alternativa, recuperar valores iniciais da economia social que se perderam", como os da democracia participativa e da relação entre iguais, explicou.
Além disso, quer abarcar outros valores como a diversidade cultural e outras formas de solidariedade, "como com o ambiente, de acordo com uma sociedade não antropocêntrica mas ecocêntrica", acrescentou.