História de uma escritora que nasceu sem apelido por ser filha de branco

por Agência LUSA

Baptizada sem apelido, apenas Maria de Fátima, por ter nascido da relação de uma negra com um estrangeiro branco, hoje tem pseudónimo literário e contou a sua história numa autobiografia ficcionada.

Chó do Guri (negação da criança) carrega no seu pseudónimo literário o peso de uma história pessoal comum a muitas crianças africanas, o de ter nascido filha de mãe negra e pai branco e, portanto, como diziam os padres católicos na altura, "filha do pecado".

Quando começou a escrever o livro lançado quinta-feira em Luanda, numa sessão que decorreu no Centro Cultural Português e que contou com a presença da viúva de Agostinho Neto, Maria Eugénia Neto, Chó do Guri pensou em intitulá-lo "A Filha do Pecado".

Quase 20 anos depois de ter sido iniciado, o livro, que era para ser apenas uma autobiografia, foi lançado com o título de "A Filha do Alemão" e já transformado numa ficção de inspiração pessoal, onde a experiência da autora, disse a própria à Agência Lusa, é apenas "uns 30 por cento" do total da obra.

O livro inaugura a colecção Vozes de África da editora angolana Mensagem, que já tem no prelo uma antologia de 30 anos de contos tradicionais, o "Roteiro da Literatura Angolana" e o "Sagrada Esperança" de Agostinho Neto, numa edição trilingue (português, inglês e francês).

Em relação a Chó do Guri, que nasceu em 1959 na Quibala, província do Cuanza-Sul, o seu nome é já um dos mais importantes da literatura angolana.

António Fonseca, economista e escritor, afirmou, na apresentação do livro, que "A Filha do Alemão" é um "grande subsídio para o estudo da história recente de Angola", ao mesmo tempo que permite compreender melhor "as novas classes sociais de Angola" e "conhecer a alma e a história recente" do país.

Livro íntimo que tardou quase duas décadas a ser escrito, "A Filha do Alemão" foi usado pela sua autora como mecanismo de auto- aceitação da sua biografia.

"Depois do parto desta obra, sinto-me aliviada. Tinha necessidade de me aceitar tal como sou", explicou.

Da Alemanha hitleriana a Angola, passando pelos Açores, "A Filha do Alemão" é uma história contada ao longo de mais de meio século "com uma grande carga emocional e de intensidade dramática", sintetizou António Fonseca, que há 29 anos apresenta, na Rádio Nacional de Angola, o programa "Antologia" sobre a tradição da literatura oral angolana.

Chó do Guri, que em 2003 ganhou o prémio do Instituto Marquês de Valle Flor para a literatura Africana pelo seu primeiro romance, "Chiquito de Camuxiba", tem já pronto a editar um novo livro, este de poesia, a sua verdadeira paixão. Chama-se "Na Boca Árida da Quianda" e sairá com a chancela da Kilombelombe.

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